sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Nietzsche - intrigante, demasiado intrigante (parte 2)






por Victor Breno



A problemática sobre Deus sempre foi ponto central na reflexão especulativa da filosofia ocidental. Convencionalmente chamada também de metafísica, tinha como objetivo descrever e elucubrar inteligivelmente a respeito das dimensões além-empíricas do mundo. Labutava em tratar dos problemas centrais da filosofia teórica: Existe um Deus? A um sentido último para a existência humana? Para onde caminha a história e a humanidade? A metafísica tornou-se uma das disciplinas fundamentais dos sistemas filosóficos desde o nascimento da filosofia até o século XIX.
Até Nietzsche, todos os filósofos ocidentais começaram e desenvolveram seus sistemas filosóficos tendo metafísica como seu início e o seu mais alto ponto de reflexão. Desde Aristóteles, passando por nomes como Agostinho, Tomás de Aquino, Leibniz, Spinoza, Kant, a problemática de Deus sempre instigou a consciência filosófica durante as épocas.
Todavia, diferentemente dos seus antecessores, Nietzsche pretende orienta sua filosofia dentro de um espaço mais prático e em crítica radical a tudo o que existia já não seguindo esquemas conceituais nem cosmovisões esquematizadas. Em sua filosofia, ele rompe com a reflexão metafísica, dando início ao período chamado de pós-metafísico. Isso não exclui totalmente a filosofia metafísica, mas sim seu aspecto objetivo. Estabelece uma nova forma de filosofar, começando agora com a problemática da moral e fundamentando o neo-ateísmo, um tipo de crítica religiosa com aspectos mais práticos existencialmente. Para Penzo, em Nietzsche não existe uma crise no pensamento metafísico, mas uma metamorfose desde, tornando a crise a dimensão fundante do divino pós-metafísico[1].
A Europa de Nietzsche, do século XIX, vivia em meio à grande clímax de progresso científico e tecnológico. Com o processo contínuo de dessacralização do estado, secularização dos espaços privados e públicos da sociedade e o desencantamento das estruturas de pensamento dos indivíduos começa-se a perguntar: faz diferença crer em Deus? Faz diferença acreditar que ele não existe? Neste processo de formação de uma nova cultura surge Nietzsche, declarando que “Deus morreu”. Ele critica a religião e a Deus como inimigo do potencial humano e que eram como ervas daninhas contra a vida. Para ele a moral cristã só trouxe conformismo e mediocridade aos homens.
Na tentativa de sintetizar e esquematizar seu pensamento, cinco temas centrais que perpassam sua filosofia do início ao fim podem ser postos: a morte de Deus, o niilismo, o super-homem, a vontade de potência e o eterno retorno. Acredito que, tomando e entendendo brevemente cada um desses conceitos de Nietzsche, poderemos chegar a uma compreensão mais clara a respeito de sua idéia sobre Deus.


[1] PENZO, Giorgio, GIBELLINI, Rosino. Deus na filosofia do século XX, p. 14.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Nietzsche - intrigante, demasiado intrigante (parte 1)


por Victor Breno

1) Dados biográficos 

Friedrich Wilhelm Nietzsche nasceu no dia 15 de outubro de 1884 em Röcken, na Saxônia, província do poderoso império da Prússia. Sua família descendia de uma longa linhagem de comerciantes, todavia, seu avô e seu pai dedicaram-se ao ofício religioso como pastores luteranos. Assim, como filho de família protestante, desde pequeno estava envolvo num ambiente religioso.
Com apenas cinco anos de idade, Nietzsche perde o pai, morto por um derrame cerebral, fato que recorrentemente mencionará em suas notas autobiográficas. Isso faz com que sua mãe se mude para Naumburg, pequena cidade às margens do Saale, onde Nietzsche cresceu, em companhia da mãe, duas tias e da avó.
Com catorze anos, ganha uma bolsa de estudos e é admitido na famosa escola interna de Pforta, considerada a melhor escola pública inglesa da época, passando lá cerca de seis anos. Nesta época, por influencia de algumas leituras e professores, começa a afastar-se do Cristianismo. Em 1864, aos dezenove anos foi estudar teologia e filosofia na Universidade de Bonn, todavia, um pouco mais a frente, deu continuidade apenas aos estudos em filosofia clássica. Tornou-se admirador da música de Richard Wagner e da literatura de Arthur Schopenhauer.
Ritschl, importante professor, recomenda Nietzsche como professor de Filofogia clássica na Universidade de Basiléia em 1869. Seu primeiro livro a ser escrito foi O nascimento da tragédia, publicado em 1872. Assim deu início a uma vasta obra literária que dentre outras podem ser citadas: Humano, demasiadamente humano (1878), Aurora: pensamentos morais (1881), A gaia ciência (1882), Assim falava Zaratustra (1883), Além do bem e do mal (1885), Genealogia da moral (1888) e O Anticristo (1888).
Segundo Zilles, a evolução do pensamento de Nietzsche pode ser distinguida em três etapas. A primeira, com as obras Origem da tragédia (1871) e Considerações extemporâneas (1873-76), seus trabalhos estético-filosóficos. Segunda etapa marcada por sua expressão pessoal e vai se aproximando do positivismo e dos iluministas franceses, com os livros: Humano demasiadamente humano (1878) e Gaia ciência (1882). E terceiro, com ênfase no tema da morte de Deus, além-do-homem, vontade do poder e eterno retorno, nas obras: Genealogia da moral (1887) Assim falava Zaratustra (1883-85), entre outras[1].
Devido a sua antiga e contínua debilidade na área da saúde, Nietzsche é forçado a deixar seu posto de professor em 1876 e partir daí viver continuamente viajando na Europa em busca de cura. Em 1889 Nietzsche é internado até a sua morte por estado de loucura. Morre em 25 de agosto de 1900.
Teve impacto com seus escritos não somente em vida, mais principalmente depois de sua morte. Atingiu e influenciou um grande número de pessoas, gerações e movimentos com suas idéias. Por outro lado, pesaram sobre ele duras críticas, tão ferrenhas quando aquelas proferidas por ele pela religião.

Pequena Bibliografia:

BEARDSWORTH, Richard. Nietzsche. São Paulo: Estação Liberdade, 2003.
NIETZSCHE, Friedrich W.  Assim Falava Zaratustra. São Paulo: Hemus, 1977.
__________A Gaia Ciência. São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores,  Vol. XXXII), 1974.
__________Humano demasiado humano.  São Paulo: Brasiliense, 2ª ed., 1988.
__________O Anticristo.  Rio de Janeiro: Ediouro, 4ª ed. [s.d.]
__________O Anticristo: Ensaio de uma Crítica do Cristianismo. São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores, Vol. XXXII), 1974.
__________Ecco Homo: Como Se Chega a Ser o que Se é. Rio de Janeiro: Organizações Simões, 1957.
PENZO, Giorgio, GIBELLINI, Rosino. Deus na filosofia do século XX.  São Paulo: Edições Loyola, 2a Ed, 2000.
ZILLES, Urbano. Filosofia da religião. São Paulo: Paulus, 1991.



[1] ZILLES, Urbano. Filosofia da religião, p.165.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Desenvolvimento psiquico da experiencia religiosa em adultos: anotações [PARTE 2]





por Victor Breno




Outra grande contribuição no entendimento da dinâmica da religiosidade é oferecida por Fowler[1], descrevendo as etapas pelas quais a fé religiosa se desenvolve. O estágio zero é o da fé original. Serve de base para todos os outros estágios da religiosidade e funda-se na confiança emocional elementar desde o útero. Surge depois, na primeira infância a chamada fé intuitivo-projetiva.  Aqui, por via de assimilação dos comportamentos que o rodeiam, a criança passa a, juntamente com o seu caráter egocêntrico e da imaginação, fazer as primeiras pequenas sínteses religiosas baseadas nas proibições e diretrizes morais.
Um segundo estágio é a fé mítico-literal. Com a diferenciação entre imaginação e realidade, a criança é abre-se a perspectivas outras e a internalização do meio social. A criança deste grupo tem fortes tendências ao literalismo antropomórfico e a estreita moralidade. O terceiro estágio é o da fé sintético-convencional. Nesta etapa, no início da adolescência e com transição para o pensamento formal, acontecem assimilações e projeções sobre realidades adquiridas na experiência interpessoais e pelos referenciais de autoridade.
            O estágio quatro é chamado de fé individual-reflexiva. Acontece uma reflexão individual pelo adolescente onde ela pode relativizar o que recebeu, abandonando-o. Este jovem passa agora a articular por si só os significados simbólicos, assumindo com isso também a autonomia na construção de sua própria identidade. A fé paradoxo-consolativa é o quinto estágio.  É uma etapa não alcançada por todos e é caracterizada principalmente por um assumir-se diante da verdade religiosa, ou um profundo sentimento de solidão. O individuo é mais receptivo a outras realidades religiosas tomando consciência de que as ambigüidades das tradições religiosas podem ser integradas.
            Num último estágio está a fé universal. É por assim dizer o nível mais alto do desenvolvimento religioso, alcançado por pouco e que é caracterizado pelo “desenraizamento de si mesmo, por uma compreensão e uma valorização plena do universo e dos outros, e o vazio de si mesmo, num processo de comunhão radical que se manifesta numa opção pela justiça e pelo amor.” [2]
O esquema apresentado acima é representativo para descrever a seqüência evolutiva da religiosidade durante a vida. Queremos agora neste ponto, passar para as observações acerca da experiência de conversão.
O tema da conversão de adultos é central, como já falado anteriormente no estudo. Um dos pontos interessante na analise é o fato das crises de conversão. As teorias sobre este fenômeno podem ser agrupadas em quatro grandes grupos, como sintetizou Ávilla[3]: 1) predisposição de personalidade ( quando as experiências de vida levam ao indivíduo, pelas particularidades de quem é, a uma experiência religiosa); 2) busca de solução para um conflito pessoal ( uma forma de reorganização da vida superando dependências e deficiências); 3) a identidade e busca de sentido; 4) razoes sociais ( questões de dimensão econômica, familiar, cultural).
Outro grupo de resultados evidenciou também fortemente três tipo de conversão apontadas por Clark, no livro de Ávilla: crise definida, estímulo emocional e despertar gradual. Em outra perspectiva, Lofland e Skonovd propõe seis motivos para a conversão: a) intelectual; b) mística; c)experimental; d) afetiva; e) revivalista e f) coercitiva.

Buscando “amarrar” essa diversas tendências Ávilla novamente sintetiza o que para ele parece ser os grandes tipos de conversão: 1) aquelas provocadas por experiências dramáticas; 2) como solução para um problema humano; 3) provocadas por experiências místicas e 4) de despertar religioso[4].


[1] FOWLER, J. W. Estágios a fé – a psicologia do desenvolvimento humano e a busca de sentido, p. 100
[2] ÁVILLA, Para entender a psicologia da religião, p.181.

[3] ÁVILLA, Para entender a psicologia da religião, p.183-184.
[4] ÁVILLA, Para entender a psicologia da religião, p.189-192.